(FOLHAPRESS) – As organizações Educafro (Educação e Cidadania de Afrodescendentes e Carentes) e Centro Santo Dias de Direitos Humanos apresentaram na quarta-feira (23) uma ação civil pública contra o LinkedIn pela derrubada de anúncio de vaga que dava prioridade a pessoas negras e indígenas na seleção.
As entidades querem que a rede social voltada de trabalho seja condenada a pagar R$ 10 milhões em danos morais coletivos, que deverão ser destinados a entidades ou ações definidas pelo Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial.
As duas entidades foram autoras de ações contra os supermercados Assaí e Carrefour. No primeiro, um homem negro foi obrigado a se despir para provar que não tinha furtado produtos. No segundo, João Alberto Silveira Freitas morreu por asfixia depois de ser agredido por seguranças em uma unidade em Porto Alegre (RS).
O LinkedIn diz que as políticas de publicação de vagas não permitem anúncios que excluam ou demonstrem preferência por profissionais. A restrição vale, segundo a empresa, para quaisquer tipos de características, sejam elas idade, gênero, raça, etnia, religião ou orientação sexual.
Procurado novamente nesta quinta (24), a plataforma disse não ter novo posicionamento sobre o assunto.
O advogado que assina a ação, Marlón Reis, diz entender que a conduta do LinkedIn contraria a Constituição e os compromissos assumidos pelo Brasil para lidar com a inclusão de segmentos vulnerabilizados.
A ação das organizações foi distribuída nesta quinta (24) à 3ª Vara Cível de São Paulo. Além da indenização, elas pedem que o LinkedIn seja condenado a assumir compromisso público de reativar todas as vagas com ações afirmativas e inclua cláusulas antirracistas em seus contratos.
EMPRESAS FAZEM MANIFESTO CONTRA LINKEDIN
Também na quarta, entidades empresariais começaram a divulgar cartas nas quais questionam a decisão do LinkedIn, pedem que a plataforma detalhe os critérios para manter anúncios de vagas e explique como vê os programas de ações afirmativas no Brasil.
Em um documento com o título de “Manifesto empresarial em defesa da ação afirmativa”, empresas dizem que estão sendo afetadas pela decisão do LinkedIn de retirar anúncios que indicam priorizar pessoas negras e indígenas.
“A suposta política antidiscriminatória do LinkedIn é anacrônica, obtusa e deslocada da realidade social, racial e de gênero do Brasil”, afirmam.
Nenhuma empresa, no entanto, assume a autoria do texto, que ainda está aberto para assinaturas. Também não foi divulgada uma lista de quem o apoia.
A reportagem confirmou, porém, que a Natura&CO, empresa mãe de Natura, Avon e The Body Shop, e a XP assinaram o manifesto.
Também apoiam a iniciativa os movimentos Mulher 360, Coalização Empresarial Para Equidade Racial e de Gênero, Fórum de Empresas e Direitos LGBTI+, Instituto Ethos e Rede Empresarial de Inclusão Social.
Em outro posicionamento contrário às políticas do LinkedIn, o grupo Iniciativa Empresarial pela Igualdade Racial, que reúne 60 grandes empresas, encaminhou à rede social uma carta na qual afirma que a política de publicação pode significar “um enorme retrocesso no país, aliás quanto a um tema já exaustivamente debatido no Brasil em todas as esferas jurídicas.”
A empresa de origem alemã Bayer é uma das que confirmou ter assinado a carta. Em 2020, a empresa teve trainee para candidatos negros.
Em publicação no LinkedIn, o Observatório da Diversidade na Propaganda convidou a plataforma a “atualizar sua política interna em relação a esse tipo de recrutamento”. O posicionamento foi assinado por 17 agências de publicidade.
“Nos preocupa a principal plataforma que conecta profissionais e mercado de trabalho adotar um discurso desatualizado e desconectado dos recentes avanços na inclusão de profissionais de grupos minorizados no mercado formal”, afirmam.
ENTENDA O CASO
O jornal Folha de S.Paulo mostrou, no sábado (19), que um anúncio de uma vaga para a coordenação do setor administrativo e financeiro do Laut (Centro de Análise da Liberdade e do Autoritarismo) foi derrubada pelo LinkedIn alguns dias depois da publicação.
A Natura também teve um anúncio de vaga para pessoas negras derrubado há alguns dias.
O LinkedIn afirma que suas políticas são detalhadas, transparentes e aplicadas a todos os usuários da plataforma em todo o mundo, e que parte do entendimento de que pessoas com os mesmos talentos devem ter acesso às mesmas oportunidades.
“Entendemos que em alguns países, como o Brasil, a legislação permite que empregadores apliquem esses critérios em seus processos de seleção. Revisitamos regularmente nossas políticas para garantir que apoiamos a diversidade e a inclusão de candidatos no LinkedIn e, consequentemente, no mercado de trabalho”, diz a plataforma, em nota.
O Procon-SP e o Ministério Público Federal também notificaram a o LinkedIn. O órgão de defesa do consumidor questiona a rede social sobre como é feita a publicação de vagas em sua plataforma, se há políticas norteadoras para o processo e como os anunciantes são informados sobre elas.
Para os procuradores da República, a derrubada da publicação contraria os esforços para a inclusão por meio de ações afirmativas.
Em nota, o MPF diz que o STF (Supremo Tribunal Federal) entende medidas como a reserva de vagas “não somente como reparação histórica em favor de grupos subalternizados, mas como forma de beneficiar toda a sociedade prospectivamente, por meio da construção de espaços mais plurais e menos excludentes”.
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Colaborou Douglas Gravas
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