BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (4) o projeto que estabelece um piso nacional para enfermeiros sem apontar uma fonte específica para custear a despesa, em texto criticado pela equipe econômica e por estados e municípios pelo receio do impacto dessa mudança sobre suas finanças.
O texto, do senador Fabiano Contarato (PT-ES), foi aprovado por 449 a 12. Como não houve alteração em relação ao projeto do Senado, segue para sanção ou veto do presidente Jair Bolsonaro (PL).
O projeto cria um piso de R$ 4.750 para os enfermeiros. Técnicos em enfermagem receberiam 70% desse valor, e auxiliares de enfermagem e parteiras, 50%. De acordo com a proposta, o valor será corrigido anualmente com base no INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor).
O texto veio do Senado sem fonte apontada para custear o piso. Entidades do setor, por sua vez, buscaram alertar para o impacto do projeto. A Anahp (Associação Nacional de Hospitais Privados) calcula que o impacto pode chegar a R$ 5,7 bilhões para estabelecimentos do setor público.
Outros R$ 6,4 bilhões afetam instituições privadas sem fins lucrativos, efeito que pode acabar recaindo sobre o governo, uma vez que parte dessas organizações são remuneradas pelo SUS (Sistema Único de Saúde) pela prestação de serviços.
O Tesouro Nacional, por sua vez, estima um impacto ainda maior, de até R$ 7 bilhões, no caso de hospitais públicos, e de R$ 8 bilhões no caso das filantrópicas. Segundo os técnicos do governo, o custo adicional recai quase totalmente sobre as finanças de estados e municípios.
Ainda no início da votação o líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), tinha indicado não haver de onde tirar os recursos para bancar o piso. Ele disse, no entanto, que o governo era contrário à retirada de pauta do projeto.
“Nós queremos votar o projeto, mas queremos entregar no contracheque dos enfermeiros o valor. Então espero que até o final desta votação nós encontremos uma solução que viabilize a fonte para esses recursos, para que todos saiam daqui com a certeza de que de fato foi uma vitória.”
Ao final, porém, admitiu que ainda não havia encontrado fonte para os recursos e orientou o voto contrário ao projeto. “O projeto não atende à lei de responsabilidade fiscal e não pode ser sancionado”, disse. Ele afirmou que o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), só enviará o texto à sanção após a fonte de recursos estar disponível.
“O que foi dito aqui, eu vou repetir. A deputada Carmen Zanotto (Cidadania-SC) falou na tribuna que o presidente Arthur Lira só mandará esse projeto a sanção quando as fontes de recursos estiverem resolvidas. Citou uma PEC que tem que ser votada dois turnos no Senado e dois turnos na Câmara que poderá viabilizar a constitucionalidade desse projeto para que nós possamos sancioná-lo quando ele for enviado à presidência da República.”
Para tentar achar os recursos, Lira havia criado um grupo de trabalho que se debruçou sobre o tema em busca de uma fonte de recursos. Na terça-feira (3), em entrevista, ele afirmou que os deputados ainda estavam discutindo fonte de custeio para o projeto.
No relatório, Zanotto afirmou que a análise de impacto financeiro e orçamentário incide sobre a esfera federal e, nos termos apontados pelo grupo de trabalho, “restringe-se a aproximadamente R$ 50 milhões ao ano na União.”
“Trata-se de montante bastante reduzido frente às dotações anuais constantes das programações de Ministérios como Saúde e Educação, que congregam vários dos profissionais alcançados pela proposta.” O relatório de Zanotto diz que a despesa pode ser absorvida pelas dotações específicas ou por créditos suplementares.
O próprio grupo de trabalho, porém, cita que o Ministério da Saúde estimou o impacto total do projeto em R$ 22,5 bilhões.
O Conass (Conselho Nacional de Secretários de Saúde) e o Conasems (Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde) também analisaram o impacto para profissionais do setor público e prestador de serviços do SUS, nos estados e municípios. A estimativa de impacto total é de R$ 26,5 bilhões.
“Tendo em vista que a proposta gera impactos financeiros nos entes públicos, bem como no setor privado, com e sem fins lucrativos, já tramitam nas duas Casas diversas propostas que ampliam receitas ou desoneram encargos; além da ampliação de recursos a serem repassados pelo Fundo Nacional de Saúde para reforçar as transferências aos entes federados”, escreveu Zanotto no parecer. “Entretanto, como não dizem respeito diretamente à fixação do piso salarial, serão tratadas em propostas independentes.”
Durante a votação, Zanotto falou novamente sobre o tema. “No Senado Federal acabou de ser lida a PEC [Proposta de Emenda à Constituição] de número 11, e aqui na Câmara nós temos várias iniciativas parlamentares e no Senado que buscam garantir o respectivo financiamento”, ressaltou.
“Portanto, como foi assumido com a enfermagem brasileira, não será na semana que vem que esse projeto seguirá para sanção presidencial. E sim, tão logo a gente vote a PEC nos dois turnos no Senado, nos dois turnos aqui na Câmara, a gente garanta o respectivo financiamento”, disse.
No Senado, o presidente Rodrigo Pacheco (PSD-MG) disse que havia um esforço para identificar uma fonte de custeio para pagamento do piso nacional dos enfermeiros.
“Além disso, há uma iniciativa, uma PEC para sanar um vício de inconstitucionalidade aparente neste projeto do piso dos enfermeiros. Há todo o nosso desejo de evoluir nessa PEC que corrija esse vício para evitar apontamento de inconstitucionalidade do projeto.”
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