BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Apesar de o presidente Jair Bolsonaro (PL) ter afirmado nesta terça-feira (2) que está garantida uma atualização da tabela do Imposto de Renda (IR) no ano que vem, a medida ainda não está de fato alinhada dentro do governo.
A perda de arrecadação gerada pela atualização do Imposto de Renda continua sendo vista como um entrave para ser viável e, por isso, é defendida no Executivo a ideia de que as mudanças precisam de compensações.
Ainda não estão definidas quais seriam essas contrapartidas, mas alguns exemplos são citados. Por exemplo, a limitação das despesas médicas que podem ser deduzidas do Imposto de Renda -o que poderia gerar um espaço fiscal de R$ 20 bilhões.
Promessa da campanha de 2018, a correção não foi implementada na gestão de Bolsonaro -apesar de ter sido enviada em junho de 2021 ao Congresso dentro do projeto de lei do governo que alterava essas e outras regras tributárias.
O texto enviado pelo governo passou pela Câmara, mas parou no Senado diante de resistências a pontos-chave do projeto -principalmente a cobrança sobre dividendos, que despertou reações do empresariado). Diante do entrave, o governo deixou a atualização de lado concluindo que, sozinha, ela reduziria a arrecadação sem as devidas contrapartidas.
Agora, Bolsonaro volta a prometer a correção para 2023. “Já está conversado com Paulo Guedes [ministro da Economia], vai ter atualização da tabela do IR para o próximo ano. Já está garantido já, não sei o porcentual. Está virando redutor de renda, não uma tabela”, disse o presidente.
Nas discussões, é mencionado que a desoneração para as classes mais baixas precisa ser levada adiante com reduções de benefícios concedidos às classes mais altas.
Esse pressuposto é usado, inclusive, no debate sobre como deve ser bancado o aumento definitivo para R$ 600 do Auxílio Brasil a partir do ano que vem. O governo vê como crucial a taxação de dividendos, que tributaria os mais ricos e poderia ser fonte de recursos para os pagamentos mais altos.
A ideia já foi tentada no ano passado, quando o governo planejava usar R$ 20 bilhões da reforma do IR para bancar o lançamento do Auxílio Brasil.
Apesar de atender aos requisitos da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que exige contrapartidas para despesas permanentes, a taxação de dividendos não livraria o governo de outra dor de cabeça ao elevar de forma definitiva o Auxílio Brasil: o potencial descumprimento do teto de gastos (que impede o crescimento real das despesas federais).
Para resolver esse problema, é citada a necessidade de cortes de outras despesas e relembrada a proposta de desvinculação, desindexação e desobrigação do Orçamento -bandeira do Ministério da Economia não implementada de forma completa.
O governo mantém a ideia de enviar a proposta de Orçamento de 2023 ao Congresso neste mês sem a previsão de R$ 600 para o Auxílio Brasil. A ideia é deixar as discussões orçamentárias (e o aumento no programa social) para o primeiro ano de um eventual novo mandato.
A tabela de cobrança do IR é a mesma há sete anos, quando o salário mínimo era de R$ 788. Com a previsão de um salário mínimo de R$ 1.294 em 2023, em texto aprovado da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias), os brasileiros que receberem R$ 1.941 (1,5 salário mínimo) terão de pagar IR a partir do ano que vem, caso a tabela não seja corrigida.
A falta de correção da tabela do IR combinada com o aumento da inflação no Brasil tem gerado um aumento histórico da tributação sobre a população com menor poder aquisitivo, segundo estudo do Sindifisco Nacional (que representa os auditores-fiscais da Receita Federal).
De acordo com uma simulação feita pela entidade, uma pessoa que recebe R$ 5.000, após deduções, paga atualmente R$ 505,64 de IR. Se toda a defasagem da tabela fosse corrigida, esse valor cairia para R$ 24,73 -uma diferença de quase 2.000%.
O levantamento feito pelos auditores da Receita mostra que a defasagem da tabela do IR chegou a 147,37%, considerando o período de 1996 -ano em que deixou de sofrer reajustes anuais- a junho deste ano. Antes, nos anos de inflação descontrolada, a tabela sofria reajuste automático por um indexador, a Ufir (Unidade Fiscal de Referência).
Foi no segundo ano do governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB) que a atualização anual deixou de ser feita. A partir da gestão tucana, a correção passou a ser feita de maneira intermitente, como em 2002 e, nos governos do PT, entre 2005 e 2015 -último ano em que houve reajuste.
Durante o governo de Bolsonaro, a defasagem está acumulada em 26,6% até junho, segundo dados do Sindifisco. O valor está acima de qualquer outro presidente desde a implementação do Plano Real. Segundo a entidade, nenhum outro chefe do Executivo realizou a correção integral da tabela do IR.
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