LEONARDO VIECELI
RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Apesar de registrar avanço ao longo da última década, a participação das mulheres no mercado de trabalho segue distante da masculina e é ainda mais complicada para as brasileiras que são mães, sobretudo as com filhos mais novos.
“A despeito dos avanços na participação feminina no mercado de trabalho, as mulheres ainda enfrentam muitos desafios”, aponta o estudo do FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas). “Esses desafios crescem substancialmente após o nascimento dos filhos, visto que as mulheres gastam, em média, mais horas do que os homens em tarefas domésticas e cuidados com crianças e idosos”, acrescenta.
O levantamento, liderado pela economista Janaína Feijó, do FGV Ibre, em colaboração com os pesquisadores Valdemar Pinho Neto e Luísa Cardoso, vai do quarto trimestre de 2012 a igual intervalo de 2021, período mais recente com dados disponíveis. A análise envolve apenas casais heterossexuais, com ou sem filhos de até 18 anos.
No quarto trimestre de 2012, a participação das mulheres com filhos na força de trabalho era de pouco mais de um terço (36,4%), enquanto a dos homens chegava a quase três quartos (73,6%).
Ao longo da década, esse gap recuou, chegando a uma diferença de 31,5 pontos percentuais no quarto trimestre de 2019, às vésperas da pandemia.
Com os efeitos da crise sanitária, que destruiu empregos e paralisou escolas e creches, a lacuna voltou a subir, mas continuou abaixo do patamar de 2012.
O diferencial foi de 33,1 pontos no quarto trimestre de 2021, com taxas de participação de 38,4% para as mães e de 71,5% para os pais. A lacuna, na avaliação dos pesquisadores, permanece expressiva.
O chamado gap é definido como o diferencial ou lacuna entre as taxas de participação feminina e masculina, que correspondem ao percentual de mulheres ou homens inseridos na força de trabalho, em relação ao total de mulheres ou homens em idade de trabalhar (14 anos ou mais).
A força de trabalho é formada tanto por quem está ocupado com alguma vaga (formal ou informal) quanto por quem está desempregado, ou seja, em busca ativa por oportunidades no mercado.
“Após a maternidade, a mulher muitas vezes não consegue voltar para o mercado ou só retorna quando o filho é adolescente. O ponto aqui é a existência desse gap”, afirma a economista Janaína Feijó, pesquisadora do FGV Ibre.
“Houve melhora ao longo da década, mas ela não foi suficiente para mudar o quadro. Parte das empresas faz esforços para ser mais amigável com as mães, abrindo a possibilidade de jornadas mais flexíveis. As novas gerações também entendem mais a divisão das tarefas entre os casais, mas o gap é persistente”, completa.
Idades dos filhos e das mães impactam trajetória De acordo com a análise, quanto mais novo é o filho, menor é a probabilidade de a mãe participar da força de trabalho.
No quarto trimestre de 2021, as mulheres com crianças recém-nascidas (menos de um ano de idade) tinham participação 49,6 pontos percentuais abaixo da registrada pelos homens.
No caso dos filhos com dez anos, a diferença entre pais e mães era menor, de 26,3 pontos percentuais.
Já no recorte dos filhos com 18 anos, o gap de participação baixava para 22,8 pontos percentuais entre homens e mulheres.
“Os filhos em idade pré-escolar (zero a cinco anos) tendem a precisar de mais cuidados e demandam mais das mães, de modo que a idade dos filhos importa para a trajetória e as escolhas profissionais das mulheres”, diz o estudo.
“Com o passar dos anos da primeira infância, as mulheres tendem a aumentar sua probabilidade de estar no mercado, mas só conseguem se aproximar dos patamares observados antes da maternidade após o filho praticamente se tornar adulto”, completa.
Segundo os pesquisadores, o período no qual as mulheres se tornam mães também pode ser decisivo para a inserção na força de trabalho e no tipo de emprego.
O cenário mais desfavorável ocorre entre as mais jovens, na faixa de 18 a 24 anos, com filhos mais novos, de zero a cinco anos.
Nesse recorte, o gap de participação frente aos homens girava em torno de 46,8 pontos percentuais no quarto trimestre de 2021.
“As mulheres mais jovens são mais penalizadas. Muitas vezes, elas têm de interromper os estudos, que são importantes para a entrada no mercado e a busca por posições com bons salários”, avalia Janaína Feijó.
“O atraso da maternidade pode melhorar um pouco a situação”, aponta Valdemar Pinho Neto.
Diferença também aparece entre mulheres e homens sem filhos Na comparação entre as mulheres e os homens sem filhos, as diferenças também são nítidas. Contudo, estão menos acentuadas do que no recorte entre mães e pais.
No quarto trimestre de 2021, a participação das mulheres sem filhos na força de trabalho (48,1%) era inferior em 21,6 pontos percentuais frente à dos homens sem filhos (69,7%). No quarto trimestre de 2012, estava em 24,7 pontos percentuais.
“Mesmo depois de uma década, a diferença ainda é elevada entre homens e mulheres”, aponta Valdemar Pinho Neto, professor da FGV EPGE e um dos coautores do estudo.
O levantamento avalia microdados da Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua), divulgada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Melhora depende de conjunto de ações Segundo os pesquisadores, novos avanços no cenário dependem de uma combinação de fatores.
Além de um desempenho mais robusto da atividade econômica, que poderia gerar espaço para absorver profissionais afastadas do mercado, há necessidade de o país pensar em políticas públicas que alinhem trabalho e vida pessoal de mães e pais, indicam os pesquisadores.
Nesse sentido, eles sugerem o debate sobre a expansão da oferta de creches e escolas de tempo integral, além da ampliação da licença-paternidade ou da criação de uma licença parental.
O estudo ainda compara o rendimento habitual por hora entre mulheres e homens empregados com trabalho. No quarto trimestre de 2012, as mães recebiam 30% a menos do que os pais.
A diferença diminuiu ao longo da década, mas continua acima de 20%. Ao final de 2021, o gap de renda era de 22,8%.
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